Relato de caso de dor crônica unilateral de uma lesão na virilha relacionada ao esporte é discutido juntamente com a fisiopatologia, diagnóstico e tratamento propostos.

Por Melissa Ruth Blum, DO

A virilha é definida como a área delineada pela coluna ilíaca anterior super-ior, o púbis e o ligamento inguinal, assim como todas as estruturas que contêm. A dor na virilha vista em atletas foi categorizada usando muitos termos diferentes – hérnia desportiva, pubalgia atlética e virilha de hóquei. Descrita pela primeira vez por Gilmore em 1980 como uma dilatação do anel inguinal superficial, as pesquisas atuais especulam que a etiologia é multifatorial. Agora um diagnóstico comum em atletas de alta intensidade envolvidos em esportes que requerem rápidas mudanças de direção durante a corrida, uma hérnia esportiva é qualquer condição que cause dor unilateral na região da virilha sem uma hérnia demonstrável. Essa dor pode surgir de músculos, tendões, ossos, bursa, fáscia, nervos e articulações.1 Neste trabalho será apresentado um caso clínico seguido de uma discussão sobre hérnias esportivas incluindo a fisiopatologia, diagnóstico e tratamento propostos, bem como uma discussão específica do tema.

Case Report

BH é um homem de 21 anos de idade que se apresentou para uma avaliação de acupuntura após queixar-se de dor na virilha desde os 16 anos de idade. Ele era um ávido jogador de lacrosse no ensino médio e teve que parar de jogar devido à gravidade da dor. Em uma escala de um a dez, BH afirmou que a dor era de dez no seu pior. Ele descreveu a dor como um esfaqueamento e um puxão na natureza com um início insidioso. Foi exacerbada por uma actividade intensa e aliviada por estar sentado quieto. A dor começou no quadrante inferior direito do abdómen e irradiou para o testículo direito.

BH procurou cuidados médicos aos dezasseis anos de idade. Fez um extenso exame por um urologista e todos os exames foram negativos; doenças sexualmente transmissíveis, torção testicular e epididimite, entre outras condições, foram descartadas. Sentindo-se aliviado de que a dor não era causada por uma condição “grave”, mas frustrado por não ter uma explicação, BH viu então um cirurgião ortopédico. O paciente foi submetido a outro exame caro e, incidentalmente, foi descoberto que tinha uma hérnia discal central de base ampla em L4-5. Ele deixou este segundo médico e outro caro exercício físico, sentindo-se frustrado e sem uma explicação para a dor na virilha. Finalmente, após vários anos a lidar com a dor diariamente, ele procurou a acupunctura como último recurso.

Apresentação

No exame físico, BH era um homem saudável, musculado e sem qualquer angústia aparente. A dor na virilha descrita na história do paciente foi reproduzida com flexão de quadril e joelho a 90 graus à direita; em outras palavras, BH tinha um “sinal de passo” positivo (ver Figura 1). Entretanto, quando o quadril foi flexionado e o joelho estendido, a dor não foi reproduzida (ver Figura 2).

O paciente tinha força muscular plena (cinco em cinco) em todos os grupos musculares da extremidade inferior bilateralmente. O paciente estava neurovascularmente intacto e tinha reflexos normais com reflexo de +2 patela e Aquiles e Babinskis para baixo bilateralmente. A amplitude de movimento foi testada e estava em limites normais, com exceção de uma diminuição da anteversão (rotação interna do quadril). Muitos testes especiais foram realizados conforme apresentado na Tabela 1. Todos os testes foram negativos, exceto a diminuição da sensação sobre o dermatoma L4, como esperado nos resultados da RM.

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Tabela 1. Testes Especiais Realizados no Exame Físico do Paciente BH
Nome do Teste O que testa Resultado
Caminhada do Calcanhar Tibialis Anterior L4, L5, S1 Negativo bilateralmente
Pernas a pé Gastrocnemius S1 Negativo bilateralmente
Pernas a pé rectas raise HérniaDisk Negativo bilateralmente
Lasegue (teste de perna direita) HérniaDisk Negativo bilateralmente, dor a 80
Bragger’s (teste de perna direita com dorsiflexão) Irritação da raiz do nervo Negativo bilateralmente
Sinal luminoso Radicular dor Negativo bilateralmente
Sacroilite Dores radiculares Negativo bilateralmente
Faber’s Sacroilite WFL esquerda, anteversão decrescente direita
Thomas Iliopsoas contracture Negativo bilateralmente
Thompson teste Ruptura do tendão de Aquiles Negativo bilateralmente

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Discussão de hérnias desportivas

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Representando 5-7% de todas as lesões, hérnias desportivas são comuns entre os atletas envolvidos em desportos que requerem cortes, pivôs, pontapés e curvas apertadas como o futebol, o futebol e o lacrosse.2 Nos últimos anos, tem sido dada mais atenção às hérnias desportivas com atletas conhecidos e de sucesso, como Donovan McNabb, que sucumbiram à sua aflição. Em 2005, McNabb foi submetido a uma cirurgia de fim de temporada, após um ataque duro que exacerbou a sua hérnia desportiva. Apesar da propaganda mediática, a etiologia, o início e até mesmo a terminologia variam muito na literatura.1 Geralmente pensado como sendo o resultado de microtrauma repetitivo, as hérnias desportivas desenvolvem-se tipicamente de forma insidiosa com sintomas decorrentes da musculatura abdominal inferior e da musculatura da coxa superior. O termo “hérnia desportiva” é enganador, uma vez que não existe hérnia demonstrável. São mais comuns nos homens, sendo a dor descrita como unilateral e difusa com possíveis radiações para a coxa medial, períneo e testículos (ver Quadro 2). A dor é agravada pela intensa atividade, risos e manobras de valsalva.3

Tabela 2. Sintomas comuns de hérnias desportivas

  • Dores unilaterais na virilha
  • Não há hérnia palpável
  • Insidioso início
  • Em repouso sem pâncreas
  • Não aliviado por medidas conservadoras
  • Possível radiação na coxa medial

Embora os sintomas não sejam contestados, várias fisiopatologias foram descritas na literatura. Algumas definem hérnias desportivas como um inchaço ou defeito na parede inguinal posterior resultando numa perda de integridade do canal inguinal sem a presença de uma hérnia óbvia4; enquanto outras atribuem a condição a um defeito muscular ou avulsão da musculatura do tubérculo púbico que leva à fraqueza da parede inguinal ou do anel5. O reto abdominal, em combinação com a patologia adutora, têm sido citados como os defeitos mais comuns dos tecidos moles juntamente com iliopsoas, reto femoral e envolvimento de sartorius como os grupos não-adutores mais freqüentemente afetados.6

A região da virilha é complexa e contém um número de músculos, nervos, tendões e órgãos. Assim, o diferencial de dor na virilha de um atleta é vasto, inclusive:

  • patologia intra-abdominal, como apendicite ou síndrome do intestino irritável,
  • anormalidades geniturinárias, como doenças sexualmente transmissíveis,
  • torção vertebral,
  • nefrolitíase,
  • dorreferida da coluna toraco-lombar,
  • entrelaçamento de nervo,
  • estirpe muscular,e
  • patologia da nave.

Após as condições de risco de vida estarem descartadas, o diagnóstico é feito principalmente pela história e exame físico. Os sintomas clássicos descritos devem estar presentes durante seis a oito semanas e o paciente deve falhar o tratamento conservador para ser diagnosticado com uma hérnia desportiva. Os pacientes também devem estar livres de dor em repouso com o retorno da dor ao retomar a atividade.1,4

Quando tal dor persistir, uma série de estudos de imagem pode ser realizada para confirmar que não há outra causa da dor. É importante notar que esses estudos podem não confirmar o diagnóstico de uma hérnia esportiva, mas fornecem informações valiosas na definição de outras patologias potenciais. A literatura afirma que a Ressonância Magnética (RM) pode ser útil na demonstração de anormalidades musculares e edema, assim como outras patologias como hérnias verdadeiras.7 Outros estudos sugerem que a ultrassonografia pode ser útil por ser não invasiva e menos cara que a RM. Ela pode fornecer informações valiosas sobre a localização e extensão das lesões tendinosas, destacando as áreas hipoecóicas que representam lesões parciais do tendão.8 Como – sempre, como a ultra-sonografia em todos os campos médicos, ela é dependente do operador e tem reprodutibilidade variável.

De modo geral, medidas conservadoras como repouso, atividade restrita e uso de não esteróides são tentadas em primeiro lugar, seguidas de fisioterapia com o objetivo de estabilizar e fortalecer a pélvis e a anca.3 Se um paciente falha na terapia conservadora e continua com dor após seis a oito semanas, a exploração cirúrgica é indicada.3 Alguns cirurgiões se concentram nos elementos externos do canal inguinal e reparam a fáscia oblíqua externa ou reforçam a virilha com o reto abdominal, enquanto outros apóiam o uso de uma colocação de malha semelhante a uma reparação cirúrgica inguinal.9 Não há consenso para apoiar qualquer procedimento em particular – ambas as abordagens laproscópica e anterior foram utilizadas e têm uma taxa de sucesso de cerca de 90%. A maioria dos pacientes retorna à atividade completa dentro de duas a seis semanas após a reparação laproscópica e um a seis meses de reparo aberto.10 Outros que acreditam que o problema reside nos músculos abdominais inferiores ou no aprisionamento do nervo o tratam de acordo.11

Anatomia Revisitada

A maioria de todas as lesões na virilha pode ser atribuída a tensões musculares, mais notadamente encontradas nos grupos adutores e flexores de quadril. A anatomia da virilha envolve uma confluência de estruturas que podem ser altamente variáveis. Como descrito acima, a literatura cita o envolvimento muscular como uma possível etiologia das hérnias desportivas. O paciente, BH, descreveu dor na virilha que irradiava para a região testicular e coxa interna, que é infundida pelo 12º nervo torácico e o primeiro nervo lombar. Ao examinar o plexo lombar, é evidente que os três nervos principais que fornecem sensação à virilha – o ilio-hipogástrico, o ilioinguinal e o genitofemoral – partilham todas as raízes nervosas comuns: nervos lombares um e dois (ver Figura 3). A anatomia destes nervos varia imensamente de pessoa para pessoa12, pelo que a etiologia pode ser diferente em cada indivíduo. Uma idéia geral do curso dos nervos, juntamente com manter a mente aberta em relação às variações anatômicas, é crucial.

Os primeiros ramos do nervo lombar a formar o nervo ilioinguinal e o nervo ilio-hipogástrico. Ambos atravessam o psoas maior e o transversus abdominus. O nervo ilioinguinal geralmente passa medialmente através do quadrado lombar e ilíaco antes de viajar através do anel inguinal superficial para dar sensação à virilha interna e à coxa medial, enquanto o nervo ilio-hipogástrico viaja posteriormente para os rins e se divide em um ramo lateral e anterior na crista ilíaca.

O primeiro e segundo nervos lombares combinam-se para formar o nervo genitofemoral, que é responsável tanto pelos membros eferentes como aferentes do reflexo cremasteriano. Ele emerge novamente na superfície anterior do psoas maior e se divide em dois ramos: um ramo femoral que fornece a pele anterior à parte superior do triângulo femoral e o ramo genital que, nos homens, percorre o anel inguinal superficial e fornece o músculo cremaster e a pele escrotal.

Uma irritação em qualquer um desses nervos pode ser responsável pela dor referida na virilha vista na paciente BH. O fato da dor ter sido reproduzida quando o reto femoral foi isolado durante o teste do “sinal de passo” sugere que há um componente muscular na dor. A patologia do quadril tem sido citada como causa da dor na virilha e é importante entender a anatomia dos dois principais flexores do quadril: os músculos iliopsoas e reto femoral.

O termo iliopsoas é usado para se referir a um grupo de três músculos – o psoas maior, o psoas menor e o ilíaco (veja Figura 4). Estes músculos são distintos no abdômen retroperitoneal e geralmente indistinguíveis na coxa. O psoas maior tem origem ao longo das superfícies laterais dos corpos vertebrais T12-L4. O psoas menor origina-se ao longo dos processos transversais de L1-5, e o ilíaco origina-se na fossa ilíaca da pélvis. O psoas maior une-se com o ilíaco ao nível do tendão conjunto e atravessa a articulação do quadril para se inserir no trocanter inferior. O psoas menor se insere no arco iliopectínico. Para isolar o músculo iliopsoas, o paciente fica propenso e o quadril é flexionado a 90 graus com o joelho estendido, aproximando-se da origem e inserção, como mostra a Figura 2. Innervated by lumbar nerve roots two, three and four, the iliopsoas is the strongest hip flexor and is important for standing, walking and running.

Commonly thought of as a knee extensor, the rectus femoris muscle flexes the hip and is innervated by the same three lumbar nerves that innervate the iliopsoas group, namely lumbar nerves two, three and four. Localizado no meio da coxa anterior, o músculo reto femoral é originado por dois tendões, anteriormente na coluna ilíaca anterior superior e posteriormente a partir de uma ranhura acima da borda acetabular. Insere-se na patela juntamente com os outros três músculos quadríceps: o vastus medialis, o vastus intermedius e o vastus lateralis. Como o reto femoral tem origem na pélvis e atravessa a articulação do quadril, pode atuar como alavanca para flexionar a perna no quadril. É um flexor da anca mais fraco quando o joelho está estendido porque já está encurtado e sofre de insuficiência activa (a incapacidade de um músculo que se estende por duas articulações para atingir uma força de contracção total devido ao limite do comprimento do músculo). Em essência, levantar uma perna endireitada vai recrutar mais o grupo muscular iliopsoas. Para isolar o músculo reto femoral, o paciente coloca a dorsal, e o quadril e o joelho são flexionados a 90 graus para aproximar-se da origem e inserção, como visto no teste especial ‘step sign’ (ver Figura 1).

Discussão

Desde que uma hérnia esportiva não é visível, não pode ser palpada e muitas vezes não pode ser confirmada com estudos imaginários, um exame físico completo é crucial não só para obter o diagnóstico, mas também para controlar o custo do trabalho. Ao pensar na etiologia da dor na virilha, é importante determinar a intensidade e a localização dos sintomas do paciente. No caso da BH, foi realizado um exame músculo-esquelético minucioso abrangendo todos os grupos musculares, levando ao diagnóstico de dor referida na virilha secundária à irritação do nervo causada pelo músculo reto femoral. É importante pensar em todos os grupos musculares. Se cada grupo de flexores da anca não tivesse sido isolado, o diagnóstico pode não ter sido feito.

Muitas vezes, pensa-se que a patologia muscular se deve aos músculos ligados à pélvis, uma vez que a pélvis actua como um ponto central do corpo e toma tanta força com o atletismo de alto impacto. No entanto, qualquer dano muscular ou hipertrofia que afecte um nervo pode causar esta dor radiante. Pode-se imaginar um homem com bíceps hipertrofiados ou aumentados. Quando este homem veste uma camisa, pode-se ver claramente a hipertrofia como mangas esticadas e apertadas. Isto é semelhante ao que acontece internamente com a hipertrofia muscular – como o músculo cresce dentro da fáscia, o excesso de pressão é colocado sobre as estruturas circundantes. Com a anatomia variável da região da virilha, é importante isolar cada grupo muscular no exame físico. Como visto no paciente BH, a dor na virilha na região ilioinguinal, genito-femoral e ilio-hipogástrica foi reproduzida quando o grupo muscular reto femoral foi isolado durante o teste do “sinal de passo”. Talvez, como um atleta, o movimento e atividade constantes causem hipertrofia muscular, o que resulta em aprisionamento nervoso real, tensão nas estruturas fasciais ou compressão do tendão conjunto levando à irritação dos nervos que o atravessam.

Em pacientes com lesões nervosas, seria interessante investigar o papel que a acupuntura pode ter no auxílio do diagnóstico e do tratamento. Por exemplo, no meridiano hepático13 existe um ponto chamado Yin Lian, que se localiza na extremidade proximal da coxa abaixo do tubérculo púbico e na borda lateral do músculo raptor longo da coxa. Quando isolado, este ponto visa diretamente o nervo genitofemoral. Talvez, pontos de acupuntura como este seriam capazes de reproduzir sintomas e auxiliar no diagnóstico.

Conclusão

Parte do exame físico, seria inestimável ter uma ferramenta de triagem mais eficaz para esta condição. Como os atletas estão em constante movimento, os testes para lesão muscular são limitados nesta população devido à probabilidade de creatinina quinase elevada na linha de base. Assim, uma grande ênfase é colocada em testes especiais e imagens. Com os recentes avanços em imagem, alguns estudos estão focando o uso da RM para distinguir a lesão de partes moles. Embora esta seja uma ferramenta promissora, a importância de um exame físico músculo-esquelético sólido não pode ser sobrestimada. Como visto com BH, um exame físico e um conhecimento profundo da anatomia não só leva ao diagnóstico como diminui o custo do cuidado com a saúde, eliminando exames desnecessários, além de dar ao paciente paz de espírito com um diagnóstico preciso e tratamento apropriado.

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